Ploft

Mateus Feld

Eu acredito em coisas demais.

Você, provavelmente, também.

Eu acredito que todas as coisas nas quais acreditamos, na verdade, significam muito menos do que o quanto queremos acreditar que elas significam enquanto acreditamos nelas.

Crenças são tão frágeis e facilmente estilhaçadas como papel higiênico ou a pele humana. Nós somos frágeis. Somos frágeis, nesse sentido, porque é muito fácil acreditar (ou não acreditar) em algo. É muito fácil estocar uma crença na nossa Estante de Crenças. Elas ficam lá, bonitinhas, em ordem alfabética, separadas em suas categorias, escritas à tinta e pena, em letras curvilíneas e acidentais, e olhamos para elas com orgulho, e as grudamos no peito e as defendemos e as pregamos. Eu acredito. Eu não acredito. Mas, às vezes, chega um ponto de nossas vidas em que elas simplesmente caem da estante. Ou alguém as derruba no chão para nós.

Ploft.

E isso acontece o tempo todo.

Eu acreditava que Rose e Jack eram reais.

Ora, ninguém nunca havia me dito que não eram. Até que, um dia, alguém me disse.

Ploft.

Viu só?

Tudo bem. Coisa pequena. Algumas outras crenças podem ter uma influência maior nas nossas vidas.

Eu acreditava que seria músico. Descobri que não serei. E ainda não sei exatamente o que vou ser no lugar.

(Isso é um pouco assustador.)

Eu acreditava que nunca viveria um amor. Hoje, eu não acredito que viveria outro (ou que outra pessoa fosse me entender e aguentar tanto quanto eu preciso ser entendido e aguentado).

Eu acreditava que todo ‘cara bombado do esporte’ ou ‘fã de música que não é boa de acordo com o que eu acredito que seja música boa’ era idiota. Hoje, eu nem acredito: eu sei que eu que era um idiota.

Eu olho para a minha Estante, e eu não sei se tenho mais coisas empilhadas nela ou jogadas no chão.

Eu ainda acredito num bocado de coisas, pensando nisso agora.

Eu acredito que queijo ralado tem cheiro de vômito;

Eu acredito que o cara que inventou o ar-condicionado seja um anti-herói;

Eu acredito que um dia vamos nos entediar com a Internet e só esquecer dela; E eu acredito que isso vai acontecer porque ainda vai surgir algo maior e mais legal que a Internet;

Eu acredito que ainda não existam tipos de cursos de graduação o suficiente para a quantidade de tipos de pessoas que existem;

Eu acredito que o socialismo nunca daria certo;

Eu acredito que o final de Lost foi ótimo;

Eu acredito em talento;

Eu acredito que um talento pode ser aprendido;

Eu acredito que o dinheiro traz felicidade;

Eu acredito que o dinheiro não resolve infelicidades;

Eu acredito no Big Bang, na evolução e na Ciência;

Eu acredito que a religião, no geral, ainda é uma coisa boa;

Eu acredito que você nunca vai se arrepender de gastar aquela graninha a mais em um jantar bacanudo; ou com aquele show do caralho que você sempre quis ver; ou num bom motel; ou numa viagem; ou naquele presente que você sabe que vai fazer a pessoa tremer;

Eu acredito que nem a tecnologia vai poder ajudar quando estivermos fodidos de verdade na Terra;

Eu acredito que as pirâmides são a coisa mais maneira que a humanidade já fez;

Eu acredito que já chega de sitcoms por um tempo;

Eu acredito que estaríamos ferrados se não fossem os filósofos;

Eu acredito que os Games são a arte mais completa de todas as Artes;

Eu acredito que não há como valorar arte;

Eu acredito que não existe “pessoa de Humanas” e “pessoa de Exatas”;

Eu acredito que “pagar pra ler matéria online” não é o que vai resolver o problema do jornalismo.

Eu acredito que “ninguém aqui é professor de português” não é uma desculpa aceitável para poder distribuir e-mails dizendo “estarei lhe enviando o anexo”, “espero que você esteja ao par do assunto” e “preciso que isso seje feito” com razão;

Eu acredito que beleza óbvia é um saco;

Eu acredito que o ‘vamos marcar, sim’ devia ser mais valorizado;

Eu acredito que pais deveriam sair mais;

Eu acredito que o casamento não fortalece uma relação;

Eu acredito que se o Twitter mudar, fodeu;

Eu acredito que nenhum Top 5 de qualquer coisa dura por muito tempo;

Eu acredito nas batatas;

Elas ainda vão nos salvar

Eu acredito que muitas das coisas nas quais eu acredito hoje ainda vão mudar e desmudar com o tempo;

E eu acredito, nesse momento, que nunca faltaria algo na minha estante para ser incluído aqui, e que eu poderia continuar escrevendo esse post para sempre;

Ploft.

***

Mateus Feld
Revisão: Nicole Roth

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Written by Mateus Feld

Fundador da adormecida publicação O Centro. Eventual escritor de contos curtos, curtos demais.

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